A partir de segunda-feira (3), candidatos e
partidos políticos terão prazo de 30 dias para encaminhar as prestações de
contas relativas às campanhas à Justiça Eleitoral. O material deve conter todos
os gastos, além das contas dos respectivos comitês no primeiro turno. Em caso
de segundo turno, o prazo é de 20 dias, a contar de 31 de outubro, dia seguinte
ao pleito.
De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cabe aos ministérios
públicos estaduais e Federal o processamento e a apuração dos indícios de
irregularidade relativos à arrecadação de recursos e gastos eleitorais e
obtidos mediante o cruzamento de informações de órgãos e entidades da administração
pública.
Conforme explica o dirigente do Centro de Apoio Eleitoral (Cael), do Ministério
Público do Estado do Espírito Santo (MPES), promotor de Justiça Cláudio José
Ribeiro Lemos, nas eleições para presidente da República, sob a
responsabilidade do TSE, quem atua como Ministério Público Eleitoral (MPE) é o
procurador-geral eleitoral, que é o procurador-geral da República.
Já nas eleições para governador, senador, deputado federal e deputado estadual
(ou distrital), a jurisdição é dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs). Nesse
caso, representa o MPE o procurador regional eleitoral, isto é, um procurador
da República lotado no respectivo estado. “Cabe a ele todas as funções
eleitorais desta eleição, inclusive a prestação de contas. Salvo crime eleitoral,
cuja competência é o local em que o crime for cometido e aí quem atua é o
promotor eleitoral com atribuição naquele local. Por essa razão, qualquer
questão envolvendo a prestação de contas das eleições de 2022 deve ser buscado
o procurador regional eleitoral, no Ministério Público Federal”, explica o
promotor.
Confira na entrevista a seguir a fiscalização da prestação de contas
Como são identificados os indícios de irregularidades na arrecadação e nos
gastos eleitorais?
Os indícios de irregularidades podem chegar ao conhecimento dos órgãos de
fiscalização tanto através dos canais de denúncia, quanto a partir da
apresentação de prestação de contas parciais/finais, onde a própria justiça
eleitoral faz a análise das contas, através dos setores especializados, e o
cruzamento de dados, sendo verificados os recibos eleitorais, gastos e
arrecadação de campanha, extratos bancários, recebimento de recursos de fontes
vedadas etc.
Assim, com a apresentação das contas finais, a Justiça Eleitoral determinará a
imediata publicação de edital para que qualquer partido político, candidato ou
coligação, o Ministério Público, bem como qualquer outro interessado, possa
impugná-las no prazo de três dias. A inobservância do prazo para encaminhamento
das prestações de contas impede a diplomação das eleitas ou dos eleitos
enquanto perdurar a omissão.
Em resumo, o que deve ser observado, primordialmente, pelas candidaturas na
hora de prestar contas à justiça eleitoral?
A Lei 9.504/97 disciplina, nos artigos 28 a 32, a prestação de contas relativas
à arrecadação e aplicação de recursos nas campanhas eleitorais. A Resolução TSE
23.607/2019 dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos
políticos e candidatas ou candidatos e sobre a prestação de contas nas eleições
de 2022.
Devem ser observados pelos candidatos as disposições constantes nas normas
acima, como, por exemplo, os limites de gastos que foram estabelecidos pelo
TSE, visto que o gasto de recursos além dos limites estabelecidos sujeita os
responsáveis ao pagamento de multa no valor equivalente a 100% da quantia que
exceder o limite estabelecido (artigo 6º da Resolução TSE 23.607/2019).
Também devem ser observadas as disposições do artigo 53 da Resolução TSE
23.607/19, que estabelece as informações e documentos que devem compor a
prestação de contas. Como, por exemplo, a abertura de conta bancária específica
e a obrigatoriedade de constituição de advogado para a prestação de
contas.
O senhor teria casos recentes para apontar aqui no Espírito Santo de
políticos que, após tomarem posse, perderam o cargo por conta da prestação de
contas?
Há um caso ocorrido em anos anteriores, onde os ministros do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) confirmaram, por unanimidade, a cassação do mandato do deputado
estadual Almir Vieira (PRP). Na época, a cassação não decorreu unicamente da
análise de contas, mas também pela gravidade dos fatos, tendo o político sido
acusado de arrecadação ilícita de recursos na campanha de 2014.
O relator do processo, ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, argumentou no
voto proferido durante o julgamento que a cassação do mandato do parlamentar
com base no art. 30-A da Lei 9.504/97 (Lei das Eleições) deveria ser mantida em
razão da gravidade da conduta a ele imputada, capaz de comprometer a lisura do
pleito e a paridade entre os candidatos, tanto pelos valores envolvidos quanto
pela omissão das informações prestadas nas contas de campanha.
Em casos como esse que o senhor relatou, como se dá
o processo?
Estabelece o artigo 30-A da referida lei que qualquer partido político ou
coligação poderá representar à Justiça Eleitoral, no prazo de 15 dias da
diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir a abertura de
investigação judicial para apurar condutas que desrespeitem as regras relativas
à arrecadação e gastos de recursos em campanha. Se for comprovada a arrecadação
ou o gasto ilegal de recursos, o dispositivo determina que o candidato eleito
tenha o mandato cassado.
Vale destacar que o julgamento da prestação de contas como contas reprovadas
e/ou aprovadas com ressalvas não acarreta, por si só, a perda e/ou cassação do
diploma do candidato. O partido que descumprir as normas referentes à
arrecadação e à aplicação de recursos perderá o direito ao recebimento da quota
do fundo partidário do ano seguinte, sem prejuízo de responderem os candidatos
beneficiados por abuso do poder econômico (Lei 9.504/1997, artigo 25).
A verificação de abuso, ou de outros ilícitos, é que pode acarretar o
ajuizamento de representação com base no artigo 30-A da Lei Eleitoral, Aije
(Ação de Investigação Judicial Eleitoral ou Aime (Ação de Impugnação de Mandato
Eletivo), que podem acarretar a perda do mandato, ou até mesmo a ocorrência de
crime eleitoral, como no caso de apresentação de algum documento falso, que
poderia configurar o crime de falsidade ideológica eleitoral.
E em relação às doações para campanha, o que a legislação prevê atualmente?
O financiamento por empresas ainda é permitido?
Para realizar sua campanha, as candidatas, os candidatos e os órgãos
partidários podem receber recursos próprios, doações de pessoas físicas, doação
de outros prestadores de contas de recursos privados, do Fundo Partidário e do
Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), recursos oriundos de
comercialização de bens e/ou serviços ou de promoção de eventos, e dos
rendimentos gerados pela aplicação dos recursos ao longo da campanha ou da
locação de bens próprios dos órgãos partidários.
As doações financeiras de pessoas físicas deverão ser realizadas por meio de
transação bancária para a conta de campanha com a identificação obrigatória do
CPF do doador. Para valores iguais ou superiores a R$ 1.064,10, a doação deverá
ser realizada obrigatoriamente por meio de transferência eletrônica entre as
contas do doador e do candidato, por meio de cheque cruzado e nominal, emitido
pelo próprio doador, ou por meio de PIX, desde que a chave seja o CPF.
As doações de pessoas físicas são limitadas a 10% dos rendimentos brutos
auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição, excetuadas as
doações e cessões de bens móveis ou imóveis, ou de serviços, até R$ 40 mil, sob
pena de pagamento de multa de até 100% da quantia em excesso, sem prejuízo de a
candidata ou o candidato responder por abuso do poder econômico.
Com a finalidade de apoiar candidata ou candidato de sua preferência, qualquer
eleitora ou eleitor poderá realizar pessoalmente gastos totais até o valor de
R$ 1.064,10, não sujeitos à contabilização. Os bens e serviços entregues ou
prestados à candidata ou ao candidato constituem doação e deverão ser
registrados na prestação de contas, sujeitando-se aos limites de doação de
pessoa física.
E no caso de a prestação conter informações falsas ou recursos de fontes
ilícitas?
A apresentação de informações falsas sujeita a infratora ou o infrator às penas
previstas nos artigos 348 e seguintes do Código Eleitoral, sem prejuízo das
demais sanções cabíveis. Outrossim, é vedada a utilização em campanha dos
recursos recebidos de pessoas jurídicas em exercícios anteriores.
Também existem outras situações em que o recebimento de recursos é vedado pela
legislação. São consideradas fontes vedadas: recursos recebidos, direta ou
indiretamente, de pessoas jurídicas; recursos recebidos de pessoas físicas
permissionárias de serviço público; recursos procedentes de origem estrangeira,
não importando a nacionalidade do doador; recursos recebidos de partidos
políticos ou candidatos não pertencentes à mesma coligação ou não coligados, ou
não federados.
Havendo indício de recurso recebido de fonte vedada, apurado durante o exame, a
prestadora ou o prestador de contas deverá esclarecer a situação e comprovar a
regularidade da origem dos recursos.
O que o senhor acha da legislação atual referente às doações e arrecadações
eleitorais?
Hoje toda a movimentação financeira da campanha tem que passar pela conta
específica que os candidatos são obrigados a abrir para gerir os gastos de
campanha. Assim, ficou mais difícil burlar a lei.
Sobre as declarações de bens dos candidatos, como é feita essa checagem se
aquilo que o candidato declarou está de acordo com o seu patrimônio?
Essa regra tem por objetivo um controle do status financeiro do candidato a
partir do momento em que ingressa na vida pública. Conforme observa Rodrigo
Zilio, busca-se evitar a utilização de cargos públicos como forma de indevido
enriquecimento ilícito. Nada obstante seja recomendável que a relação de bens
seja atualizada, pois o objetivo dessa exigência é justamente aferir a evolução
patrimonial do candidato, a lei não exige a declaração de imposto de renda, mas
apenas a declaração dos bens, sem indicar os valores atualizados e ou as
mutações patrimoniais.