Plástico: impactos dos microfragmentos no ambiente

05-06-2021 – Afolhaonline.com

No ar, no mar, na terra. A ampla disseminação do nano e microplástico acende um sinal de alerta sobre como descartamos esses fragmentos no meio ambiente e, ao mesmo tempo, lança um desafio para o qual não há resposta simples: como controlar isso? Até que uma saída seja encontrada, já é possível falar do impacto negativo desses resíduos para animais e seres humanos. 

Presentes “em todos os ecossistemas”, segundo afirma o professor do Departamento de Oceanografia e Ecologia da Ufes Fabian Sá, microplásticos e nanoplásticos se diferenciam pelo tamanho: esses por serem menores que 1 micrômetro (exclusivamente vistos por microscópio) e aqueles por não terem mais do que 5 milímetros. Apesar disso, os males que trazem à natureza são os mesmos. 

Tratados de forma geral como fragmentos, podem ser lançados na natureza em forma e tamanho originais quando provenientes diretamente da indústria de plástico, cosméticos e higiene pessoal, por exemplo. Eles também surgem no meio ambiente por meio da degradação física e causada pelo sol e pela água de produtos como garrafas pet e sacolas. Mas não só isso: “Uma das principais fontes de fibras plásticas é a lavagem de roupas sintéticas”, revela Sá. 

Impacto

Esses resíduos chegam ao meio ambiente principalmente pelo descarte irregular. No caso do lixo marinho, de 80% a 90% da poluição é transportada pelos rios, observa o professor, citando dados mundiais. “O lixo marinho é tido hoje como um dos maiores problemas ambientais do mundo e bastante complexo para se resolver”, salienta Sá. Mas o problema vai além. Hoje fala-se em chuva de plástico devido à presença, na atmosfera, desses fragmentos, menores e mais leves que a areia. Essas características fazem com que alcancem áreas florestais e acometam também animais terrestres e aves. 

“Chegando nos oceanos ou nos outros ambientes terrestres, rio, lagos, ambientes aquáticos, florestas, a principal via de entrada para os organismos é pela ingestão dessas partículas”, detalha Sá. Os maiores fragmentos podem causar obstrução no estômago e sufocamento de animais. Os menores também entram por vias respiratórias. 

O problema é que o plástico é composto por diversos polímeros e “cada polímero desses tem um efeito adverso no organismo”, alerta o pesquisador. Como se não bastasse, essas partículas atuam como vetores de outros poluentes, como metais pesados e pesticidas, que acabam parando no organismo de bichos e pessoas.

O acúmulo desses resíduos é responsável pela “perda dos serviços ecossistêmicos”, como a oferta de alimentos. “A população capixaba adora frutos do mar. Esses frutos do mar são retirados de diferentes ambientes, como o sururu do mangue”, exemplifica Sá. Quando há degradação desses ambientes, há perda desse serviço. Nessa lógica, a baixa qualidade dos alimentos causa problemas de saúde, que por sua vez geram também problemas econômicos. 

O impacto maior é sobre a biodiversidade, levando a um desequilíbrio em toda a cadeia alimentar, incluindo a do ser humano. A notícia não é boa para o capixaba, cuja dieta tradicional inclui frutos do mar. “Qualquer organismo de que você for se alimentar hoje, com certeza tem fragmentos de plástico”, afirma Sá. “A gente consome moluscos, peixes e acaba ingerindo esses microplásticos”, completa a bióloga Grazielli de Paula Pirovani.

Estudos apontam inclusive a presença desses resíduos em água potável. “Infelizmente ainda muitos sistemas de tratamento não têm a capacidade de remoção de alguns tamanhos de partícula”, explica o professor da Ufes.  

Doenças

Problemas específicos como a degradação da membrana celular, hipersensibilidade (reações indesejadas) no organismo e até casos de intoxicação foram registrados conforme Fabian Sá. “Hoje tem relatos de encontrar até microplástico em placenta humana”, destaca. 

Apesar disso, ainda não há estudos que relacionem conclusivamente a ingestão dessas partículas ao surgimento de doenças. “É muito difícil porque ambientalmente a gente está exposto a diversos poluentes, dentre eles também o microplástico. Então é muito difícil você associar uma determinada doença ou efeito deletério somente a um poluente. Pode ser até um efeito somatório, de mais de um poluente”, pondera ele.

Segundo Grazielli pi, as pesquisas na área ainda são recentes. “Isso está sendo estudado, não há nada muito comprovado de tipos de doenças que isso pode estar causando em nós seres humanos, mas já sabemos que afeta toda a cadeia alimentar, principalmente desses animais marinhos, causando um impacto muito grande na saúde deles”. 

Como solucionar

Nesse contexto, conforme defende o oceanógrafo, essa questão só pode ser resolvida com a participação, em escala global, de todas as esferas da sociedade, como poder público, cidadãos e setor produtivo. Na opinião dele, o setor público e as indústrias teriam mais peso nessa balança porque as decisões tomadas precisam ser unificadas.

A logística reversa foi uma das iniciativas citadas por ele, que inclusive já consta na Política Nacional de Resíduos Sólidos, mas “ainda está no papel”. Legislações podem contribuir, admite ele. “Um dos grandes problemas dos resíduos marinhos, aquele que você mais encontra, é justamente esses produtos plásticos de uso único”, destaca. A maioria demora mais de 100 anos para serem decompostos na natureza. 

A conscientização das pessoas na busca por produtos com vida útil maior e que não gerem tanta degradação também deve ser levada em consideração. “A gente vive hoje sem plástico? Praticamente impossível, né? Porque ele é usado para muitas coisas. Mas de qual o plástico que a gente precisa realmente?”, questiona ele. 

Para a bióloga Grazielli Pirovani, consultora ambiental credenciada pelo Instituto Lixo Zero Brasil, a saída para o problema passa pela iniciativa individual e consciente de cada cidadão.

Embora a reciclagem seja uma realidade para esse material, de acordo com o presidente, hoje existem alguns empecilhos na cadeia produtiva do plástico, como o baixo valor do material – que acaba afastando o catador – e falhas no processo da coleta seletiva do lixo praticada por prefeituras – muitas vezes os resíduos são separados nos estabelecimentos, mas transportados sem essa diferenciação. 
O investimento na área de reciclagem também é caro. Máquinas de separação total de lixo têm alto custo e só começam a dar lucro após 12 anos de uso. “É um investimento de milhões”, ressalta. 

“Hoje não tem como viver sem o plástico”, afirma Jackley, ressaltando a importância do produto para o nosso dia a dia. Além da flexibilidade no uso, ele frisa que a economia gerada pelo produto chega a 150%: se uma garrafinha de água mineral custa R$ 1 no supermercado, o mesmo produto na embalagem de vidro chegaria a valer R$ 2,50. 

O setor plástico atualmente emprega em torno de 7 mil trabalhadores e reúne aproximadamente 100 empresas no Espírito Santo. 

Década dos Oceanos

O esforço para reduzir o consumo de plástico é mundial. A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou o período de 2021 a 2030 a “Década dos Oceanos”, que traz diversos objetivos, muitos ligados à sustentabilidade. Um dos destaques é para o controle do lixo marinho.

Fonte ales.