As fake news passaram a fazer parte do cotidiano do brasileiro há alguns
anos e acabam ganhando mais notoriedade no período eleitoral. Mas para esse
ano, quando serão escolhidos deputados, senadores, governadores e presidente, o
regime de desinformação recebe um ingrediente ainda pouco conhecido e que pode
ter reflexos no pleito: as deepfakes.
Consideradas por especialistas como a evolução das
notícias falsas, as deepfakes se caracterizam pela manipulação sofisticada de
um produto audiovisual. Por meio desse processo tecnológico, é possível colocar
o rosto e a voz de uma pessoa no corpo de outra para fazer com que alguém fale
o que não disse ou aja de maneira que não se comportou.
Comumente usadas em paródias, há um terreno aberto
para a aplicação dessas manipulações na campanha eleitoral. Assim como as fake
news em geral, esse recurso pode ser utilizado de maneira a beneficiar o
candidato, ressaltando qualidades, ou de modo negativo, visando prejudicar os
oponentes. A diferença estaria na sua eficácia, avalia o coordenador de
pós-graduação em Direito Digital, Walter Capanema.
Essa técnica é relativamente nova e passou a ser
mais utilizada de três anos para cá devido à evolução dos algoritmos, explica o
especialista em segurança da informação Gilberto Sudré. Segundo ele, as
tecnologias disponíveis hoje permitem a modificação de imagens em movimento.
Até pouco tempo atrás, ressalva, as fraudes eram restritas a textos, fotos e
áudio.
Conforme explica, como o poder computacional está
mais acessível atualmente, qualquer pessoa com um certo grau de conhecimento
pode manipular vídeos, inclusive já há aplicativos com essa finalidade. Mas
para que a alteração seja bem feita, é necessário muito conhecimento na área e
uma máquina potente com uma configuração equivalente a de um computador para
jogos, detalha.
Impacto
O coordenador de pesquisa da Rede Nacional de
Combate à Desinformação, José Edgard Rebouças, acredita que, por se tratar de
um material mais profissional, as deepfakes podem exercer um poder ainda maior
de persuasão dentro do universo da desinformação. Esse efeito é observado
sobretudo em pessoas que já tradicionalmente são levadas pelas notícias falsas
mais rasas.
“Mais preocupante é a mentira rasteira do que a
profunda”, frisa. De acordo com Rebouças, se as pessoas já acreditam em
informações falsas que não exigem nenhum tipo de sofisticação, quando chega ao
nível de vídeos manipulados fica praticamente impossível questionar a realidade
junto a esse público.
É nesse contexto que o advogado Walter Capanema questiona o “custo- benefício” dessa técnica, que exige capacidade computacional diferenciada. Para ele, o brasileiro vive atualmente em uma sociedade tão polarizada que muitas pessoas não precisam de algo tão complexo para acreditar, basta ter afinidade com a sua “bolha”.
Essa característica acaba contribuindo para a
disseminação da desinformação. No geral, fake news reforçam mentiras nas quais
muitos acreditam, embora existam os mais incautos, avalia Capanema. Para
Rebouças, o fenômeno do imediatismo de “likes” nas redes sociais também se
aplica na propagação de notícias falsas. Para piorar, não há compromisso em
corrigir uma informação errada passada adiante.
A identificação das deepfakes pode ser um desafio em se tratando de uma manipulação bem feita, destaca o especialista em Segurança da Informação, Gilberto Sudré. Se esse for o caso, tende a ser desmascarado apenas por peritos forenses na área. No entanto, alerta para o conteúdo do material, pois muitas vezes pode retratar personalidade em uma situação totalmente fora do contexto.